quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Manifesto: Rio São Francisco: Questão de Vida Ou Morte


O Rio São Francisco é descrito como a principal artéria que leva vida aos nordestinos, impulsionando o desenvolvimento, sobretudo das regiões semiáridas. Em sua bacia vivem 14 milhões de brasileiros, em 503 municípios, numa área de 640 mil quilômetros quadrados. Do seu curso de 2.700 km, 58% atravessam o chamado Polígono das Secas. Mesmo sendo vital para a sobrevivência de milhões de pessoas e uma infinidade de animais e plantas, o Rio vem sofrendo nas últimas décadas as consequências da implantação de um modelo de desenvolvimento social e ecologicamente insustentável.
As marcas da destruição deixadas por este modelo de desenvolvimento são cada vez mais visíveis. As grandes barragens alteraram os ciclos naturais de cheias e vazantes do Rio, dificultando a reprodução dos peixes e desestruturando as principais atividades econômicas do povo ribeirinho. O desmatamento dos cerrados e matas ciliares, para implantação de extensas monoculturas de eucalipto, cana de açúcar e grãos, provocam a secagem de nascentes e o assoreamento do Rio. Os megaprojetos de irrigação voltados à exportação concentram terras e águas em abundantes descontroles, desestruturam a produção voltada para o mercado local e sustentável e ainda aumentam as situações de miserabilidade. A poluição causada pelos resíduos industriais, agrotóxicos e esgotos sanitários envenena as águas e ameaça as espécies.
O caminho imposto ao São Francisco pelas políticas oficiais de desenvolvimento, aliadas ao descuido generalizado com as condições do Rio, é um caminho que leva à morte. O Rio está hoje em uma situação limite, agonizante e ameaçado na sua condição de gerador de vida para milhões de brasileiros.
Não bastasse esta situação, o governo federal procede à execução do projeto de transposição de águas do São Francisco, a título de suprir as necessidades hídricas do Nordeste Setentrional (PE, PB, CE, RN). Na versão atual, quer-se levar 127 m3 de água por segundo, em duas tomadas d'água, a partir da cidade de Cabrobó - PE e do lago de Itaparica, ambos na margem esquerda. Para a água chegar às vertentes daqueles estados, terá de ser elevada a 160 metros de altura, passar por túneis e aquedutos e percorrer 2000 quilômetros de rios a céu aberto evaporando e infiltrando. Segundo o Governo, o custo será de 3,5 bilhões de reais somente em obras de engenharia.
O "Rio da unidade nacional" está se tornando o "Rio da discórdia nacional" e quem sai perdendo mais uma vez é o povo que vive na pele a seca, a sede, a fome - às vezes, a poucos metros do Rio -, sem condições de desenvolver as potencialidades e tirar proveito das vantagens do semiárido, que não é só seco, tem seu período chuvoso, mas sobre qual pouco ou nada se projeta.
Contra as falsas e alienantes soluções, que mais servem a interesses inconfessáveis, defendemos alternativas viáveis para o conjunto socioambiental do Rio São Francisco.
A construção de alternativas para a ressuscitação do Velho Chico pressupõe o envolvimento da população, a assimilação de tecnologias apropriadas e o respeito aos processos naturais. O desafio maior é promover a cidadania e o respeito, em todas as iniciativas, conscientizando e mobilizando a população, como sujeito e não mero objeto do desenvolvimento.
Os movimentos populares, articulados por ONGs, Pastorais e Igrejas, todos mobilizados na esperança de dias melhores, mostram que a convivência com o Rio Opara é perfeitamente possível, desde que se trabalhe uma cultura de harmonia e respeito, através de soluções técnicas que sejam também práticas político pedagógicas.
É indispensável a implantação de políticas públicas que compreendam o Rio na sua globalidade - não apenas como um curso d'água - e preservem esse tesouro natural e histórico, não só do semiárido, mas de todos os brasileiros. A revitalização tem que fazer efeitos imediatos e a longos prazos, de forma contínua e urgente, diretamente nas veias do Rio São Francisco. Não há mais tempo a perder, pois o Rio agoniza com as últimas forças que lhes restam.
Necessitamos hoje, neste dia 04 de outubro de 2012, levar para o âmbito da vida pública e social a lição que aprendemos todos os dias aos longos dos 511 anos com o Rio São Francisco: a doação e o serviço à vida. Necessitamos ainda, por força e apelo ao seu significado, de um modelo de desenvolvimento digno deste nome, que leve em conta as especificidades e potencialidades do nosso povo e das suas raízes.
Enfrentamos juntos ao Rio o controle do poder, deliberadamente drástico na região nordeste, ainda concentrado em mãos dos donos de terras e água, gente e capital. Sentindo a responsabilidade e importância deste 04 de outubro, frente às gerações futuras, devemos pôr em ação energias e esforços capazes de reverter estes caminhos que levam à morte do fragilizado Rio São Francisco. Devemos agir para alcançar o verdadeiro progresso, no qual os ribeirinhos e o seu Rio e todo o povo nordestino sejam vistos e tratados como fios de uma mesma teia, que é a Vida. A solução para o Rio mais brasileiro que recebeu o Santo nome de São Francisco deve unir e não dividir os filhos do Nordeste.
Nós, entidades e personalidades que assinamos este manifesto, apelamos as Autoridades Constituídas que tomem as justas e necessárias providências a respeito do Rio São Francisco: REVITALIZAÇÃO, JÁ!

E como ação local, convidamos a sociedade de Piaçabuçu para participar da REDE ECO-CULTURAL UBUNTU com o objetivo de desenvolver ações colaborativas em prol de uma CULTURA VIVA e de um “AMBIENTE ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida” (Art. 225 da Constituição Federal).

Fonte: Texto adaptado do original, encontrado no endereço http://www.agrisustentavel.com

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